terça-feira, 25 de agosto de 2009

Pobre dependência

por Wagner Hilário

Seu nome é Paulo, mas para os senhores de terno, gravata, cabelo lambido e palavras empoladas ele é joãozinho. Ele não sabe disso. Nem a gente importante sabe. É como o chamam no íntimo na hora em que dão pela presença dele. Isso porque joãozinho, minúsculo como é diante da grandeza dos nobres, é quase sempre ninguém. Só se lembram dele quando algo não funciona, quando o microfone não pega, quando um toró denuncia o serviço porco que fizeram no teto, quando a projeção pifa, quando a privada entope, deixando exposta a prova de que todos são joãozinho.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Vanessa Ferrari

por Wagner Hilário

Vencedora na vida e temente à morte — “só vence na morte quem perde na vida”, frase do papai —, Creusa Aparecida Ferreiro, com apenas dezessete anos virou Vanessa, boicotou o Aparecida, embora jamais tenha aberto mão de aparecer, e fez uma cirurgia plástica no sobrenome... Virou Ferrari e turbinou seu design.

Deu duro, sem perder a pompa, sem perder os olhos do tesouro prometido, em mapa mal-julgado, velho e encardido, gasto mesmo, de tantas as vistas que lhe passaram sobre e tiraram seu viço. Que viessem as tempestades, pensava, “os rumos do meu barco foram pintados com a tinta das estrelas, e onda nenhuma me fará voltar atrás”.

Da proa, esquecia a miséria íntima de sua cabine, e mirava mentiras e mais mentiras para além do horizonte, onde jamais ancoraria. Quem mesmo era? Quem queria ser, ou suas doloridas mazelas? De dia, era a personificação do sucesso aos olhos do seu mundo: mamãe e papai iludiam-se e ai de quem os desiludisse. De noite, ela pagava a dívida com o sol.

Queria crer nos méritos que ninguém tem; que o amanhã seria só verdade. Mas como, se já nem lembrava onde encontrá-la? Então, curtia os dias de inverno cheios de sol brando, da varanda gourmet de seu duplex, vencedora na vida e temente à morte.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Progresso e Eternidade

por Wagner Hilário
Apesar do progresso,
árvores ainda floram,
amoreiras
ainda dão amoras
e pássaros
salvam as buzinas
quando trinam sua flauta.