quinta-feira, 6 de maio de 2010

Justiça fálica

por Wagner Hilário

Todo ser humano é um infinito sideral insondável. Tobias sentia, mas não sabia disso, e como sempre negligenciou os sentimentos e superestimou a razão, permanecia ignorante. Ele só sabia disso em seu íntimo desconhecido, aquela porção de nós que não nos pertence, pertence ao sempre. Mas pra saber de verdade, com consciência, era necessário que se dispusesse a pesquisar isso em seus sonhos enigmáticos, era preciso o maior dos estudos, a que poucos de nós estão dispostos a empreender.

— Bobagens — ele dizia.

Seu caráter inquisitorial e dogmático o afastava das pessoas e o afastava de si mesmo. Não se dava conta. Sua mente privilegiada, porém, lhe assegurava uma posição social de destaque. Sua postura sobranceira inspirava o temor dos subalternos. Com esse temperamento, ele conseguiu a solidão. Depois de cansar de dizer que não tinha com ele uma relação profissional, a esposa resolveu deixá-lo e deixar toda a boa vida que a grana de Tobias ia-lhe propiciar. Foi-se embora, com o saco na lua da imbecilidade bem argumentada do marido.

Mas a todo império racionalista está reservado um tsunami do inconsciente, que traz consigo todas as impurezas de seus recalques. Frágeis, os diques de sensibilidade de Tobias foram facilmente vencidos pelo vácuo existencial em que se descobriu quando perdeu o emprego, quando se viu castrado do poder que julgava ser seu, pra sempre e desde sempre. Broxou uma, duas, três, infindáveis vezes na cama da puta, com a qual tentava salvar sua honra.

Foi depois da derradeira broxada que Tobias resolveu pôr fim ao seu drama, castigando todos os responsáveis pelos seus fracassos...

Asfixiou a puta com o travesseiro. Saiu do puteiro discretamente, mas rapidinho, antes que dessem pela morta e seguiu para a casa do ex-chefe, que o recebeu pessoalmente. Mal abriu a portão, Tobias acertou-lhe preciso na testa com uma barra de ferro que não conseguiria segurar com apenas uma das mãos. Entrou no carro, passou em casa, porque era caminho, pegou a 765 e continuou a via fatal. Tocou a campainha da casa da ex-mulher, que o recebeu, feliz como nunca e trazendo consigo uma iluminada barriga.

Tobias lacrimejou e a olhando atônito, perguntou:

— Quem é você?

— Só agora você resolveu saber?

— Eu ia te matar.

Jogou a arma no chão, dobrou os joelhos, deitou na calçada e esperou a polícia chegar.

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