terça-feira, 27 de novembro de 2012

Desencontro


/Por Diego Carvalho/

Eram sessenta e dois amigos, eram sessenta e dois motivos,
e se foram quase despercebidos, se foram todos como chegaram,
sem nem porque, nem explicação, e eu fiquei sem vozes na lembrança,
e eu fiquei sem recordação.

Era um grito destemido que chamava a atenção,
o sorriso de um palhaço que desperta a multidão,
era um circo de angústia sem macaco nem leão,
era um trapézio esquecido, um domador de ilusão.

O olho cego e perdido ao avistar a escuridão,
esperando a luz se apresentar e esperando ela brilhar.
Era igreja sem cerimônia e casamento sem altar,
vela sem oração, duas mãos sem devoção e susto sem grito.
Era romance sem paixão, um ano inteiro sem verão e espaço sem infinito.

O tempo engarrafado em doses atemporais,
esperando ser derramado sobre o fogo de um cometa.
Era pedra virando pó e mar batendo em pedra.
Era areia de ampulheta.
Da garganta vinha o nó e era o fim da esperança,
era um fim sem esperança a esperar um fim.
Era eu sem você e era você sem mim.


***
Diego Carvalho escreveu o livro Quebra-Cabeças em Peças de Vida, trabalha na área de programação e suporte de banco de dados, "adora projetos de animação" e dá aulas de jiu-jitsu e muay thai. É frequentador deste "sítio" há mais de três anos.


quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Eu-mesmo


/por Wagner Hilário/

Quando me dei
de presente
o hábito da poesia
recebi dele em troca
eu mesmo...
Assim, sempre
que me perco
(ou não)
procuro o verso
que me devolva
(me revele)
eu mesmo.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Pouco Caso


/por Wagner Hilário/

Repartiu com ele um pedaço de sua alma e, ao reencontrá-lo num canto empoeirado da escrivaninha dele, descobriu que doar e doer muitas vezes têm mais em comum do que somente a grafia.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Menino apaixonado


 /por Wagner Hilário/

— Pai, menina quando é criança gosta mais de brincar com menina, né?
— É, filho, é normal.
— E quando cresce?
— Aí gosta mais de “brincar” com menino.
— É por isso que a Bela não quer brincar comigo agora, né?
— É.
— A mamãe disse que quando eu for mais velho vai ter um monte de mulher no meu pé.
— É provável, mas você não pode ficar em cima delas, tem de manter distância, mostrar que você se basta sozinho. As mulheres gostam de homens seguros.
— A mamãe disse que você era chiclete.
— ... É... Eu era.
— Disse que depois ‘cê parou de ser... Foi quando ‘cê parou de ser que conseguiu ficar com ela?
— Não, eu grudei e não dei chance de escapar. Sua mãe diz que deixei de ser chiclete depois que ela já não queria mais escapar.
— Mas é sério que quando eu ficar mais velho a Bela vai querer ficar comigo.
— Provavelmente.
— Mas não vai ser só ela, né? Vai ser um monte igual a ela assim, né?
— (Risos!!!)

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Foto antiga


/por Wagner Hilário/

Em toda lembrança feliz
há uma poeira de tristeza;
por mais que se assopre
o tempo não volta

domingo, 20 de maio de 2012

As voltas do tempo


/por Wagner Hilário/

Tudo passa
...
O tempo cura e mata
Desmancha a beleza em rugas
Enxuga toda e qualquer lágrima

Tudo passa
...
O beijo doce amarga
O olhar d’alma embota
Desbota o amor em raiva

Tudo passa
...
Ódio, dor e mágoa
Desarmam-se enfim as mãos
Já não importa de quem foi a falha



sábado, 14 de abril de 2012

Conselho

/por Wagner Hilário/

Paixão não é senão
vontade de sentir bater
no peito de outro
nosso próprio coração

Quando correspondida:
epifania, iluminação.
Descoberta de que dois
podem ser um... Quiçá,
por toda uma encarnação

Quando não,
batida sem resposta,
chamada não atendida:
toca, toca, toca,
mas não sensibiliza...
Melhor desistir da ligação

quarta-feira, 14 de março de 2012

Auto-Eco

/por Wagner Hilário/

Por mais que se tente apagar
a verdade é indelével.
Se boa, soa,
canto aos ouvidos do benfeitor
Se má, agride: estridor.
Os atos são frases à beira do abismo;
nunca se perdem, ecoam,
voam e voltam
ao coração de quem as falou.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Métrica do Homem

/por Wagner Hilário/

Meu poema
em métrica alheia:
mosca na teia,
asas embotadas,
santa ceia
em que sou servido.

Minha pintura
na moldura errada:
natureza morta,
alma despida do corpo,
corpo sem o brilho
da alma.